domingo, 15 de janeiro de 2012

NA TERRA DOS PAPAGAIOS


Reprodução parcial do mapa elaborado por Cantino (1502)

Deixarei bem claro nesta primeira postagem que ao definir este título para este blog não houve e não há nenhuma intenção em depreciar nosso país ou a ele referir-nos pejorativamente. Cuidaremos dos fatos e acontecimentos históricos, recentes ou não. Comentaremos as ações dos governantes, de todas as épocas, e seus desdobramentos. Jamais deixaremos de expressar nosso entendimento sobre quaisquer situações e manifestar nossa opinião que, por sinal, é garantida constitucionalmente. Portanto, não mantemos vínculos com quaisquer instituições públicas ou privadas, delas não dependemos e nem recebemos qualquer tipo de favorecimento. O mesmo ocorrendo com relação dirigentes políticos, partidários, sindicais, empresariais etc. A independência, a verdade, a lisura e a ética são princípios dos quais não abriremos mão sob nenhuma hipótese. Nossas posições estarão, sempre, embasadas em fatos. E os fatos - sabemos perfeitamente - podem ser manipulados, distorcidos, minimizados, fantasiados, porém jamais negados. Entretanto, estarmos embasados em fatos não significa que não podemos interpretá-los, pelo contrário, porém com responsabilidade, sem parcialidade e com transparência e lucidez. Nosso compromisso é com a História e esperamos que, de alguma maneira, vir a enriquecê-la com nosso trabalho.

Segundo alguns registros em 1500 os navegadores portugueses ao estabelecerem contato com os índios aconteceu uma troca de presentes entre os silvícolas e os europeus. Sendo que os primeiros os presentearam com papagaios e araras, desconhecidos na Europa e, portanto, provocaram grande deslumbramento quando apresentados à Corte portuguesa. Sendo assim passaram a se referir ao lugar de onde haviam sido trazidas como Terra dos Papagaios. Não poderíamos deixar de mencionar o livro de José Roberto Torero e Marcus Aurelius Pimenta Terra Papagalli onde mesclam fatos históricos com a ficção ao narrarem a chegada do degredado Cosme Fernandes com Pedro Álvares Cabral que deram origem aos mandos e desmandos em nossa terra. Sobre este personagem os autores informam que existem muito poucos registros de sua vida no Brasil e que a maior proeza dele fora ter vendido 800 escravos índios de uma única vez. Segundo os autores Cosme Fernandes aqui chegou sem quaisquer haveres, um tanto inchado de tanto comer biscoitos estragados durante a viagem e acompanhados de outros companheiros também condenados ao desterro. Ressaltamos aqui o os dez mandamentos a serem observados na Terra dos Papagaios que, segundo Rejane Cristina Rocha é doutoranda do programa de pós-graduação em Estudos Literários da Unesp, Campus de Araraquara/SP

                                                              Fala-se de uma mazela de um tempo passado, esperando que o leitor estenda o significado para o presente, o seu próprio tempo. Fazendo isso, o leitor está, também, apreendendo o passado sob o ponto de vista do presente, participando de um jogo de contaminações mútuas que caracteriza toda a obra.

                                                            É necessário ressaltar que a apreensão dos significados irônicos do título e dos mandamentos, bem como os de toda a obra, exigem que escritor e leitor compartilhem informações a respeito de nosso passado histórico - não só informações historiográficas, oficiais, mas também toda a sorte de clichês e estereótipos que, de certa forma, também fazem parte de uma historiografia única, a que Jameson denominou história pop (JAMESON: 1996, p 52).-, e de nosso presente enquanto nação.

Reproduzimos abaixo os Dez Mandamentos para Bem-Viver na Terra dos Papagaios

1)    É preciso saber dar presentes com generosidade e sem parcimônia, porque os gentios que lá vivem encantam-se com qualquer coisa, trocando sua amizade por um guizo e sua alma por umas contas.

2)    Quando aparecer alguma dificuldade, mesmo que seja de simples solução, é preciso fazer alarde, espetáculo e pompa, pois nesta terra mais vale o colorido do vidro que a virtude do remédio.

3)    As gentes da Terra dos Papagaios são muito crentes e de fácil convencimento. Por isso, têm em alta conta os feiticeiros, os falsos profetas e vai a coisa a tanto que não há patranheiro (mentiroso) que lá não enriqueça e prospere. E assim é, senhor, que por serem tão crédulos aqueles gentios, pode-se-lhes mentir sem parcimônia nem medo de castigo.

4)    É aquela terra onde tudo está à venda e não há nada que não se possa comprar, seja água ou madeira, cocos ou macacos. Mas o que mais lá se vende são homens, que trocam-se por qualquer mercadoria e são comprados com as mais diversas moedas.

5)    Desde o primeiro, são os funcionários daquela terra um tanto madraços (indolente) e preguiçosos, e, se na frente de seus superiores parecem retos, quando esses lhes dão as costas, revelam-se muito astutos e só nos atendem se lhes damos algo em troca. Portanto, senhor conde, se fordes para lá não se esqueça de ser generoso com eles, pois lá as portas não são abertas com chaves de ferro, mas com moedas de prata.

6)    Naquela terra de barganhas fazem muito sucesso e não há quem resista a um pequeno regalo. Por isso, é preciso dar sempre um afago aos que podem comprar, pois entre dois mercadores, naquela terra não se escolhe o mais honesto, mas o que oferece mais mimos.

7)    Naquele pedaço de mundo, senhor conde, não se deve confiar em ninguém, pois se no sábado nos juram eterna fidelidade, no domingo nos enfiam uma espada pela garganta. A verdade é que lá tudo se rege pela conveniência, e sendo preciso, troca-se de bandeira como as mulheres trocam de pano em dia de regra.

8)    Na terra que se chama dos Papagaios, cada um cuida de si e Deus que cuide de todos, pois pouco se faz por um irmão, nada por um primo e menos coisa nenhuma por um amigo, de modo que cada um só quer saber do seu nariz e, se alguém faz algo por outrem, é a troco de paga ou medo.

9)    Naquelas paragens, quando se alevantam alguns, o melhor modo de quietá-los é dar-lhes emprego ou título, porque os daquela terra muito prezam serem chamados de senhores e não há um que troque honradez por honraria.

10) E o resumo de meu entendimento é que naquela terra de fomes tantas e lei tão pouca, quem não come é comido.


Infelizmente não podemos negar que em nossos quinhentos anos de História tais mandamentos tenham sido revogados através dos séculos. E, eis o mais lamentável, foram se expandindo para atender as conveniências políticas e econômicas que vigoraram e vigoram cada vez mais implacáveis sempre em detrimento da população. Um dos objetivos deste blog é despertar, estimular e fornecer subsídios para que formemos uma consciência histórica e possamos interferir nela de maneira incisiva como sujeitos históricos e repudiarmos a ideia de meros espectadores, pois, neste caso, estaremos nos anulando favorecendo que prossiga até com maior intensidade os mandos e desmandos nesta Terra de Papagaios. Devemos examinar, analisar, refletir e propor soluções para os problemas presentes cujas respostas poderão ser encontradas no passado. Papagaio repete, nós pensamos.


CELSO BOTELHO
15.01.2012

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